Como a “Entamoeba histolytica” escapa do nosso sistema imunológico

Por Brunno Câmara - quinta-feira, julho 28, 2016

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Entamoeba histolytica

A Entamoeba histolytica é um protozoário entérico que infecta humanos, sendo o agente etiológico da amebíase.

A amebíase ainda é um problema de saúde mundial, com mais de 100 mil mortes anualmente. A transmissão da doença acontece pela ingestão de alimentos e água contaminados com os cistos amebianos.

A maioria das infecções por E. histolytica é assintomática, enquanto que aproximadamente 20% dos casos apresentam manifestações clínicas, como disenteria, caracterizada pela invasão da mucosa intestinal e destruição tecidual.

Quando os trofozoítos invadem o epitélio do cólon, a resposta imune é ativada no hospedeiro humano. Para sobreviver, o protozoário precisa reprimir o sistema imune do hospedeiro e controlar o ambiente em que está.

Resposta imune durante a infecção amebiana

A infecção pela E. histolytica é iniciada quando o parasita adere-se à camada de mucina intestinal.

O muco intestinal é organizado em duas camadas: uma camada estratificada interna que está firmemente aderida às células epiteliais do intestino; e uma camada externa, não aderida. Essas camadas estão organizadas em volta de mucina altamente glicosilada, formando uma rede polimérica que é secretada pelas células caliciformes.

Os trofozoítos expressam em sua superfície um tipo de lectina (Gal/GalNAc) e se ligam à mucina e células epiteliais. Eles são capazes de causar uma destruição tecidual extensa.

Essa camada de muco do trato gastrointestinal serve como uma barreira física primária contra patógenos intestinais (imunidade inata). Adicionalmente, imunoglobulinas são o principal componente da resposta imune intestinal.

A IgA é uma das imunoglobulinas mais abundantes na mucosa intestinal e previne a aderência e remoção da camada de muco por micro-organismos. Estudos demonstram que a presença de IgA anti-lectina está relacionada com a redução da re-infecção por E. histolytica.

A resposta imune mediada por células também é importante para a defesa contra E. histolytica. Células epiteliais ligam-se e reconhecem a lectina amebiana através dos receptores Toll-like (TLR). Esse reconhecimento desencadeia a produção de citocinas inflamatórias. Linfócitos T também estão envolvidos na defesa contra o protozoário.

Escapando da defesa imune do hospedeiro

Os trofozoítos de E. histolytica secretam glicosidases (enzimas que hidrolisam carboidratos) que degradam as mucinas altamente glicosiladas da camada de muco intestinal; primeiro passo do início da colonização amebiana.

Outro tipo de enzima importante são as proteases de cisteína (PC). Após a degradação da mucina pelas glicosidases, o esqueleto proteico da mucina é degradado por essas proteases.

Existem PCs que estão associadas na superfície celular dos trofozoítos e são capazes de clivar as moléculas de IgA humana; inativam também IgG circulantes.

O sistema complemento é a principal defesa do hospedeiro quando o protozoário é exposto ao sistema imune intravascular.

Os trofozoítos escapam do ataque do complemento através da clivagem e inativação de C3a e C5a pelas PCs. C3a e C5a são potentes ativadores da inflamação e estimulam o aumento da liberação de histamina, enzimas lisossomais e citocinas pró-inflamatórias.

O protozoário é capaz de matar uma grande variedade de células, incluindo neutrófilos, linfócitos T e macrófagos. E após matá-las, a E. histolytica fagocita os restos celulares, o que minimiza a resposta inflamatória.

Os trofozoítos de E. histolytica são microaerófilos e toleram até 5% de oxigênio na fase gasosa. Eles não possuem muitos dos componentes do mecanismo antioxidante, presentes em outros organismos, como catalase, peroxidase e glutationa.

Porém, o parasita precisa escapar do ataque das espécies reativas de oxigênio e nitrogênio. Para isso, eles possuem altos níveis de cisteína ao invés de glutationa. Possuem também várias enzimas para defender contra o estresse oxidativo, como peroxiredoxina, superóxido dismutase, flavoproteína A, ferredoxina, tioredoxina e tioredoxina redutase.

Fonte: Nakada-Tsukui K, Nozaki T. Immune Response of Amebiasis and Immune Evasion by Entamoeba histolytica. Frontiers in Immunology, 2016. | Imagem: CDC

Brunno Câmara Autor

Brunno Câmara - Biomédico, CRBM-GO 5596, habilitado em patologia clínica e hematologia. Docente do Ensino Superior. Especialista em Hematologia e Hemoterapia pelo programa de Residência Multiprofissional do Hospital das Clínicas - UFG (HC-UFG). Mestre em Biologia da Relação Parasito-Hospedeiro (imunologia, parasitologia e microbiologia / experiência com biologia molecular e virologia). Criador e administrador do blog Biomedicina Padrão. Criador e integrante do podcast Biomedcast.
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