Entrevista com a Biomédica Residente Joyce Lima

Por Brunno Câmara - quarta-feira, dezembro 28, 2022

Antes de continuar a leitura do texto, quero te convidar para conhecer meus cursos:

Continue agora com a sua leitura do texto. Espero que goste.


Anualmente, o Hospital de Amor de Barretos abre duas vagas para biomédicos em sua residência multiprofissional de Atenção ao Câncer.

Por ser uma área bastante chamativa, muitos têm interesse em saber como funciona a seleção dessa residência e como ela funciona.

Por isso, convidei a biomédica Joyce Lima, que está no seu segundo ano de residência lá, para contar para a gente todos os detalhes.

Além de residente, a Joyce também é mestranda em Oncologia Molecular no Hospital de Amor, por meio do Programa de Inserção de Residentes ao Mestrado Acadêmico (PRISMA).

O grupo de pesquisa em Imuno-Oncologia, do qual ela participa, tem como intuito estudar o papel da resposta imune dos pacientes com câncer, quando tratados com imunoterapia.

Confira agora a entrevista na íntegra.

Conta pra gente um pouco sobre você e sua trajetória acadêmica.

Joyce Lima: Tenho 24 anos e me formei em 2020 pelo Centro Universitário da Fundação Herminio Ometto – FHO/Uniararas. Sou biomédica habilitada em Análises Clínicas e Biologia Molecular. 

Durante a graduação fui aluna de iniciação cientifica, fiz parte do Centro Acadêmico de Biomedicina, e fui monitora das aulas práticas da disciplina de Anatomia Humana. No último ano de graduação, fiz estágio no laboratório de diagnóstico molecular do Centro Infantil de Investigações Hematológicas Dr. Domingos A Boldrini.

Soube da residência conversando com alguns alunos da biomedicina durante um curso de férias do CNEM na FCA/UNICAMP em Limeira. 

Sempre aproveito desse fato para comentar sobre a importância de participarmos de eventos e cursos da nossa área, além de estabelecer uma rede de contatos profissionais (o famoso networking), isso nos permite tomar conhecimento sobre as diversas possibilidades do biomédico.

Como foi sua preparação para a seleção?

Joyce Lima: A prova conta com questões de língua portuguesa (análise e interpretação de textos), questões relacionadas a legislação do SUS (eixo transversal) e questões da área específica. O edital, publicado pela CONSESP, disponibiliza as matérias e referências bibliográficas sugeridas. 

Minha preparação para a prova se baseou principalmente no estudo de cada tópico sugerido pelo edital. 

Para isso utilizei materiais das disciplinas de Biologia Molecular e Políticas Públicas de Saúde que faziam parte da grade curricular da minha graduação, além de conhecimentos obtidos durante o estágio de biologia molecular na FHO e de materiais disponibilizados na internet.

Deixo como sugestão de material para estudo:

  • Canal do YouTube “Universo da Biologia Molecular” do Eduardo Castan.
  • Curso online “O Sistema Único de Saúde e sua legislação – UFRN” (Disponibilizado pelo AVASUS).
  • Curso online “Atenção Primária à Saúde: princípios e diretrizes – UFSC” (Disponibilizado pelo AVASUS).
  • Curso online “Política Nacional de Humanização – UFPE” (Disponibilizado pelo UNA-SUS).
  • Leitura das Leis Federais nº 8.080/90 e nº 8.142/90, do Decreto nº 7.508/11, e da Portaria nº 2.436/2017.
  • Livro Bruce Alberts. Biologia Molecular da Célula - 6ª Ed., 2017.

Como foi a prova da seleção que você participou?

Joyce Lima: Como eu já tinha realizado o estágio em biologia molecular, o que foi mais difícil para mim foram as questões de legislação do SUS. 

Em relação à área específica, são abordados conceitos de estrutura do DNA e RNA, cariótipo, mecanismos de reparo do DNA, dogma central da biologia molecular, mecanismos de regulação da expressão gênica e principais técnicas de biologia molecular. 

Dessas questões da área especifica, as que eu tive mais dificuldade foram sobre as técnicas de biologia molecular, principalmente em relação a sequenciamento, que é algo que não tive tanto contato durante a graduação.

Como funciona a etapa de avaliação psicológica?

Joyce Lima: Essa é a segunda fase da prova seletiva e ocorre somente na cidade de Barretos, diferente da primeira fase que pode ocorrer em outras cidades. Quanto às questões são semelhantes às realizados no exame psicotécnico.

Como é a etapa de prova oral/entrevista? O que a banca pergunta?

Joyce Lima: A entrevista é realizada pelos coordenadores do programa de residência da Biomedicina e da Biologia, e são abordadas questões sobre o histórico acadêmico e profissional do candidato, além de questões especificas sobre o currículo e atividades realizadas após a formação. 

As questões visam também conhecer melhor sobre o perfil de cada candidato (liderança, trabalho em equipe, autoconhecimento sobre defeitos e qualidades que possam impactar no decorrer da residência).


Quais são as atividades que o biomédico residente desenvolve no Hospital de Amor de Barretos?

Joyce Lima: O campo de atividade do biomédico dentro da instituição é muito amplo. Por se tratar de um hospital oncológico o residente biomédico possui uma grade de estágios em diferentes setores do hospital. O hospital dispõe de excelente infraestrutura, com vários laboratórios assistenciais e de pesquisa.  E, entre eles:

- Biobanco, tendo como finalidade o armazenamento e processamento de materiais biológicos de pacientes oncológicos com finalidade de pesquisa, além da entrega de materiais genéticos (DNA/RNA) e ou espécimes inteiros, solicitados pelos pesquisadores com rígido controle de qualidade.

- Patologia, que corresponde ao setor de entrada das peças anatomopatológicas, tanto para fim de diagnóstico quanto de pesquisa. Esse setor é subdividido em técnicas histológicas e macroscopia, técnicas citológicas e imuno-histoquímica. 

- Hemonúcleo, que é subdividido nos setores de captação e recepção de doadores, triagem, fracionamento, criopreservação, controle de qualidade, sorologia e imuno-hematologia. Após toda essa etapa pré-transfusional também acompanhamos a liberação das bolsas e transfusão. 

- CPOM que corresponde ao Centro de Pesquisa em Oncologia Molecular do Hospital do Amor instalado no Instituto de Ensino e Pesquisa (IEP). Durante esse período o residente se envolve e aprende técnicas de biologia celular e molecular que estão sendo realizadas no contexto dos vários projetos em andamento na instituição.

Passamos por estágio no Biotério, que conta com um espaço de criação e experimentação de camundongos com a finalidade de pesquisa pré-clínica e desenvolvimento de novas terapias para o tratamento do câncer.

Também realizamos estágio no Laboratório de Genética e Biologia molecular, no qual aprendemos sobre diversas técnicas e sua interpretação, entre elas, eletroforese em gel de agarose, PCR convencional, PCR em tempo real, PCR digital, Nanostring, pirossequenciamento, sequenciamento Sanger e sequenciamento de nova geração (Illumina e Ion Torrent).

E, por fim, o estágio no Laboratório de Cultura Celular, o qual desenvolvemos diferentes técnicas de cultivo celular e ensaios funcionais.

- HLA, ou laboratório de imunogenética e Virologia, responsável pelos exames de compatibilidade HLA durante as transfusões de medula, além de testes para identificação de microorganismos.

- Análises Clínicas, responsável pelos exames laboratoriais convencionais realizados com o objetivo de auxiliar no diagnóstico de doenças, além de desempenhar função de indicador do estado geral de saúde do paciente.

Laboratório do Biobanco. Divulgação/Site do HA

- Laboratório de Diagnóstico Molecular, são realizadas análises moleculares para o diagnóstico, prognóstico, monitoramento e decisão terapêutica para as neoplasias hematológicas e tumores sólidos.

No contexto da medicina de precisão, doença somática são realizados testes moleculares visando a conduta individualizada do paciente oncológico. 

Isso é possível através da avaliação da presença de biomarcadores moleculares, que são alterações genéticas em regiões gênicas específicas do genoma relacionadas a carcinogênese.

Já no contexto de doença germinativa, aprendemos e acompanhamos a rotina do setor de Oncogenética, onde é realizado testes genéticos para a identificação de indivíduos em risco para o câncer hereditário. Esse diagnóstico é fundamental uma vez que familiares de um indivíduo afetado pode apresentar risco de desenvolvimento do câncer. Assim o diagnóstico permite o melhor direcionamento para paciente e sua família.

- Laboratório de Citometria de Fluxo, a técnica permite a análise multiparamétrica de células e partículas, permitindo a caracterização e quantificação de diferentes subpopulações de células do organismo, auxiliando desta forma no diagnóstico e prognóstico de diversas doenças, na instituição tem papel fundamental nos diagnósticos das doenças hematológicas (leucemias).

- Laboratório de Citogenética, são realizados o cariótipo constitucional e de detecção de mosaicismo. Já o cariótipo onco-hematológico é indicado para o diagnóstico e ou acompanhamento de doenças onco-hematológicas. Também realizamos a técnica de FISH (Hibridização in situ por fluorescência), importante para o diagnóstico, prognóstico e orientação terapêutica de algumas neoplasias.

MiniSeq Sequencing System, CPOM - Genética Molecular. Divulgação/Site do HA

Como é sua rotina como residente? 

Joyce Lima: Nossa carga horária semanal é de 60 horas, sendo 12 horas por dia (de segunda a sexta-feira, das 07h às 19h). Os residentes da Biomedicina e Biologia não realizam plantões.

Vale ressaltar que os programas da biomedicina e biologia andam em conjunto. Sendo assim, há setores que passamos em duplas, outros individuais, e há ainda os setores que os residentes das duas especialidades passam juntos, sendo dois da biomedicina e dois da biologia. A carga horária da residência é dividida em 80% prática e 20% teórica.

Durante o primeiro ano de residência a COREMU disponibiliza aulas multiprofissionais. E durante os dois anos realizamos apresentações relacionadas aos setores que passamos e ou artigos científicos para aprofundar conhecimentos.

Participamos de eventos científicos, apresentações em eventos, organizações de curso, e durante o segundo ano da residência também atuamos como preceptores dos alunos do primeiro ano. 

Há também as provas semestrais de caráter acumulativo, aplicadas pela COREMU, cujo conteúdo cobrado está relacionado aos setores que realizamos os estágios durante a residência.

Com essa extensa carga horária, acredito que seja interessante informar que o hospital oferece café da manhã, almoço e janta, além de convênio médico e acesso a academia do hospital.

Quais conselhos você dá para quem quer fazer a residência do Hospital de Amor de Barretos?

Joyce Lima: Um dos meus maiores receios para a prova era a etapa de entrevista, pois alguns dos residentes que eu conhecia, que já faziam ou haviam feito a residência, já tinham mestrado quando entraram na residência. 

Meu conselho é não ficar tão preocupado em relação à quantidade de vaga, ou se você possui ou não alguma pós-graduação. Um dos pontos que é levantado durante a entrevista são os motivos que o levaram a prestar a prova e o que você deseja com isso. Foque principalmente em estudar para a prova objetiva e tomar conhecimento sobre o que você deseja para o seu futuro.

Outro conselho muito importante, e que é essencial, é que o residente goste de estudar, pois é algo que nunca paramos de fazer. 

De forma geral, essa é uma experiência profissional muito intensa e compensadora, uma vez que durante esses dois anos passamos por diferentes setores, que nos possibilitam ter contato com diversas áreas de atuação do biomédico. Todas essas atividades abrem um leque de possibilidades após nossa formação. 

Além disso, muitos residentes ao longo dos anos foram absorvidos pela instituição e hoje trabalham por esses vários setores que citei. É uma grande oportunidade para quem quer trabalhar com diagnóstico e/ou pesquisa. Portanto, se é isso que você deseja é importante mostrar esse desejo na entrevista.


Agradeço imensamente à biomédica residente Joyce Lima pela disposição em compartilhar conosco sua experiência numa das residências para biomédicos mais desejadas.

Brunno Câmara Autor

Brunno Câmara - Biomédico, CRBM-GO 5596, habilitado em patologia clínica e hematologia. Docente do Ensino Superior. Especialista em Hematologia e Hemoterapia pelo programa de Residência Multiprofissional do Hospital das Clínicas - UFG (HC-UFG). Mestre em Biologia da Relação Parasito-Hospedeiro (imunologia, parasitologia e microbiologia / experiência com biologia molecular e virologia). Criador e administrador do blog Biomedicina Padrão. Criador e integrante do podcast Biomedcast.
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