Tudo o que um biomédico precisa saber sobre a Proteína C reativa

Por Brunno Câmara - quinta-feira, dezembro 03, 2020

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A proteína C reativa (PCR) é uma proteína pentamérica anelar (em formato de anel) encontrada no plasma sanguíneo.

É uma proteína de fase aguda positiva, ou seja, sua concentração aumenta em processos inflamatórios agudos, principalmente.

Ela não tem relação com a Proteína C - fator anticoagulante -, nem com o Peptídeo C (insulina).

História e nomenclatura

A PCR tem esse nome por que foi primeiramente identificada como uma substância no soro de pacientes com inflamação aguda, que reagia com anticorpos contra polissacarídeos capsulares (polissacarídeo C) de S. pneumoniae na presença de cálcio.

Inicialmente, achava-se que a PCR era uma proteína patogênica já que estava elevada em muitas doenças, incluindo o câncer.

Posteriormente, descobriu-se que ela era sintetizada principalmente no fígado (produção endógena).

Estrutura e função

No ser humano, a PCR é composta por cinco monômeros (subunidades), cada um com 206 aminoácidos e massa molecular de ~23 kDa (massa molecular total = ~115 kDa). 

Ela é sintetizada primeiramente como monômeros e, após, os pentâmeros são montados no retículo endoplasmático.

Esses cinco monômeros são associados de forma não covalente, organizados simetricamente ao redor de um poro central, formando uma estrutura discoide.


A PCR pertence à família das pentaxinas (ou pentraxinas), proteínas que atuam como receptores de reconhecimento de padrões (PRRs).

Essas proteínas têm papel crucial no sistema imune inato, reconhecendo PAMPs e DAMPs. Algumas atuam como ancestrais funcionais dos anticorpos.

Especificamente, a PCR, na presença de cálcio, liga-se ao polissacarídeo fosfocolina (intermediária na síntese de fosfatidilcolina) expressa na superfície de células mortas ou que estão morrendo, e de algumas bactérias.

Cada monômero da PCR possui um sítio de ligação para a fosfocolina e liga-se a dois íons de cálcio.

Essa ligação faz com que o sistema complemento seja ativado via C1q (via clássica). Com isso, macrófagos iniciam a fagocitose de células necróticas e apoptóticas, além de bactérias.

Em resposta a danos teciduais, células inflamatórias como macrófagos e neutrófilos secretam citocinas, como IL-1, IL-6, IL-8 e TNF-α.

O fígado responde a esse estímulo produzindo muitos tipos de proteínas de fase aguda, dentre elas a PCR.

Todo esse processo é chamado de resposta de fase aguda.

Significado clínico

A PCR é usada como um marcador inflamatório.

Exceto na insuficiência hepática, há poucas causas conhecidas que interferem na síntese de PCR.

O interferon alfa (IFN-α) inibe a sua síntese nas células hepáticas. Isso explicaria uma menor elevação de PCR durante infecções virais quando comparada com infecções bacterianas.

Dosagem sérica de PCR

A detecção e dosagem de PCR é útil para determinar progressão da doença ou efetividade do tratamento.

As principais metodologias utilizadas para sua determinação são: ELISA, turbidimetria, nefelometria, imunodifusão rápida e aglutinação de partículas de látex.

O valor de referência é < 10,0 mg/L (turbidimetria).

PCR ultrassensível

Como o nome sugere, é um teste que detecta a PCR em níveis muitos baixos (elevada sensibilidade), até cerca de 0,04 mg/L.

Pesquisas recentes sugerem que pacientes com níveis basais de PCR elevados possuem maior risco de diabetes, hipertensão e doença cardiovascular.

É muito utilizada para avaliação de risco cardiovascular:

  • Risco baixo: < 1,00 mg/L;
  • Risco médio: entre 1,00 e 3,00 mg/L;
  • Risco alto: > 3,00 mg/L.

Nesse caso, os resultados de PCR ultrassensível devem ser avaliados juntamente com níveis de colesterol, LDL-c, triglicerídeos e glicemia.

Em doenças inflamatórias na fase aguda, seus níveis devem ser menores que 10,0 mg/L.

Interpretação

Níveis de PCR aumentam fisiologicamente com a idade.

Níveis mais elevados são encontrados em gestantes nas últimas semanas de gestação.

  • Inflamação leve e infecção viral: 10 - 40 mg/L;
  • Inflamação aguda e infecção bacteriana: 40 - 200 mg/L;
  • Infecção bacteriana grave e queimaduras: > 200 mg/L.

A PCR tem maior precisão e sensibilidade na resposta de fase aguda do que a velocidade de hemossedimentação (VHS).

A VHS pode estar normal enquanto a PCR está elevada e seus níveis retornam ao normal mais rapidamente em resposta à terapia do que a VHS.

Inflamação aguda

Quando há algum estímulo, a PCR pode aumentar cerca de 10.000 vezes, indo de 0,05 mg/L para mais de 500 mg/L.

Numa inflamação leve a moderada, a concentração de PCR pode alcançar de 50 a 100 mg/L dentro de 4 a 6 horas. Pode atingir seu pico em 48 horas após o dano ou inflamação.

Níveis entre 100 e 500 mg/L são altamente preditivos de inflamação causada por infecção bacteriana.

Referências

Thompson D, Pepys MB, Wood SP. The physiological structure of human C-reactive protein and its complex with phosphocholine. Structure. 1999 Feb 15;7(2):169-77.

Pepys MB, Hirschfield GM. C-reactive protein: a critical update. J Clin Invest. 2003 Jun;111(12):1805-12.

Bray C, Bell LN, Liang H, Haykal R, Kaiksow F, Mazza JJ, Yale SH. Erythrocyte Sedimentation Rate and C-reactive Protein Measurements and Their Relevance in Clinical Medicine. WMJ. 2016 Dec;115(6):317-21.

Sproston NR, Ashworth JJ. Role of C-Reactive Protein at Sites of Inflammation and Infection. Front Immunol. 2018;9:754. Published 2018 Apr 13.

Pathak A, Agrawal A. Evolution of C-Reactive Protein. Front Immunol. 2019;10:943. Published 2019 Apr 30.

Brunno Câmara Autor

Brunno Câmara - Biomédico, CRBM-GO 5596, habilitado em patologia clínica e hematologia. Docente do Ensino Superior. Especialista em Hematologia e Hemoterapia pelo programa de Residência Multiprofissional do Hospital das Clínicas - UFG (HC-UFG). Mestre em Biologia da Relação Parasito-Hospedeiro (imunologia, parasitologia e microbiologia / experiência com biologia molecular e virologia). Criador e administrador do blog Biomedicina Padrão. Criador e integrante do podcast Biomedcast.
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