Como fazer o diagnóstico laboratorial da infecção por Streptococcus pyogenes

Por Brunno Câmara - quarta-feira, dezembro 06, 2023

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O Streptococcus pyogenes é um coco gram-positivo β-hemolítico, pertencente ao grupo A de Lancefield.

É o agente etiológico de uma grande variedade de doenças indo desde infecções autolimitadas da garganta e pele, como faringite e impetigo, até doenças invasivas de sítios normalmente estéreis, como a síndrome do choque séptico estreptocócico.

Infecções de repetição e/ou não tratadas adequadamente podem se manifestar como complicações pós-infecção como glomerulonefrite pós-estreptocócica, febre reumática aguda e doença cardíaca reumática.

Fatores de virulência do Streptococcus pyogenes

A Organização Mundial da Saúde (OMS) colocou o S. pyogenes como a nona principal causa infecciosa de mortalidade humana. Sendo que a maioria dos óbitos são atribuídos à infecção invasiva e doença cardíaca reumática.

No final de novembro de 2023,  a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) publicou um alerta epidemiológico sobre o aumento de casos de doença invasiva pelo S. pyogenes em alguns países da américa do sul.

Diagnóstico da infecção por S. pyogenes

O diagnóstico da infecção dependerá da doença manifestada e complicações desencadeadas.

Algumas doenças têm seu diagnóstico principalmente clínico, como a escarlatina, a erisipela e o impetigo.

Impetigo

O diagnóstico de impetigo é feito através das características clínicas das lesões.

Caso necessário, pode-se cultivar o material obtido da base da lesão em ágar sangue ou ágar chocolate.

Pode ser feita também a detecção do anticorpo anti-Dnase B que é mais sensível para infecção cutânea do que o ASLO.

Faringite estreptocócica

O diagnóstico pode ser confirmado com a semeadura do swab de orofaringe em ágar sangue ou ágar chocolate, com uma sensibilidade clínica de 80-90%.

A cultura é o padrão-ouro para o diagnóstico. O teste de PYR é positivo.

O S. pyogenes apresenta sensibilidade à bacitracina.

Testes diagnósticos rápidos baseados na detecção de antígenos estreptocócicos têm elevada especificidade, porém são menos sensíveis que a cultura.

Proteína C reativa (PCR) pode estar elevada e ocorre leucocitose.

Doença invasiva pelo S. pyogenes

Menos comum que as doenças cutâneas e as complicações, o S. pyogenes tem a capacidade de penetrar a barreira epitelial  e causar uma variedade de doenças invasivas, com altas taxas de morbimortalidade.

As doenças invasivas mais comuns são bacteremia e celulite. As menos comuns são fasciíte necrosante, artrite séptica, pneumonia, meningite, endocardite e peritonite.

Fasciíte necrosante

É uma infecção destrutiva e progressiva do tecido subcutâneo e fáscia superficial.

Além da cultura de amostras obtidas do paciente (exsudato, tecido, aspirado, sangue), exames de imagem podem auxiliar no diagnóstico.

Na avaliação laboratorial, foi encontrado que uma contagem de leucócitos abaixo de 15.000/mm³ e sódio sérico maior que 135 mmol/L fornecem um valor preditivo negativo de 99% para a detecção de infecções necrosantes de tecido mole.

Para a fasciíte necrosante, especificamente, o sistema de pontuação (score) mais usado é o LRINEC (indicador laboratorial de risco para fasciíte necrosante).

São usados seis marcadores laboratoriais para a avaliação:

  • PCR > 15 mg/dL = 4 pontos
  • Leucócitos (mm³):
    • < 15.000 = 0 ponto
    • 15.000-25.000 = 1 ponto
    • > 25.000 = 2 pontos
  • Hemoglobina (g/dL):
    • > 13,5 = 0 ponto
    • 11-13,5 = 1 ponto
    • < 11 = 2 pontos
  • Sódio sérico < 135 mmol/L = 2 pontos
  • Creatinina sérica > 1,6 mg/dL = 2 pontos
  • Glicemia > 180 mg/dL = 1 ponto

Uma pontuação de 6 ou mais tem 92% de valor preditivo positivo para fasciíte necrosante.

Diagnóstico das complicações da infecção por S. pyogenes

Febre reumática

É uma resposta imune sistêmica desencadeada por uma infecção por S. pyogenes na orofaringe que não foi tratada adequadamente.

O diagnóstico baseia-se nos critérios Jones atualizados:

Os critérios maiores são: 

  1. Artrite
  2. Cardite
  3. Coreia de Sydenham
  4. Nódulos subcutâneos
  5. Eritema marginatum

Os critérios menores são:

  1. Poliartralgia
  2. Febre
  3. VHS (≥ 60 mm/h) e/ou PCR (> 3,0 mg/dL)
  4. Prolongamento do intervalo PR

O diagnóstico é confirmado quando são encontrados dois critérios maiores ou um critério maior e dois menores, juntamente com evidência de infecção por S. pyogenes (aumento de ASLO ou anti-Dnase B).

Glomerulonefrite pós-estreptocócica

É uma desordem mediada por imunocomplexos (hipersensibilidade tipo III) que acomete os rins.

Costuma aparecer após casos de faringite ou impetigo.

Resulta em manifestações como edema, hipertensão, anormalidades urinárias (hematúria e oligúria) e diminuição dos níveis de componentes do sistema complemento no plasma.

aumento dos títulos de ASLO e de anti-Dnase B.

Referências

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Walker, M. J., Barnett, T. C., McArthur, J. D., Cole, J. N., Gillen, C. M., Henningham, A., Sriprakash, K. S., Sanderson-Smith, M. L., & Nizet, V. (2014). Disease manifestations and pathogenic mechanisms of Group A Streptococcus. Clinical microbiology reviews, 27(2), 264–301. https://doi.org/10.1128/CMR.00101-13

Hakkarainen, T. W., Kopari, N. M., Pham, T. N., & Evans, H. L. (2014). Necrotizing soft tissue infections: review and current concepts in treatment, systems of care, and outcomes. Current problems in surgery, 51(8), 344–362. https://doi.org/10.1067/j.cpsurg.2014.06.001

Organização Pan-Americana da Saúde / Organização Mundial da Saúde. Alerta Epidemiológico: Doença Invasiva Estreptocócica do Grupo A. 28 de novembro de 2023. Washington, D.C.: OPAS/OMS; 2023.

Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Microbiologia Clínica para o Controle de Infecção Relacionada à Assistência à Saúde. Módulo 6 : Detecção e identificação de bactérias de importância médica /Agência Nacional de Vigilância Sanitária.– Brasília: Anvisa, 2013. 150p..: il.9 volumes.

Martins, M. de A., et al. (2016). Clínica Médica: alergia e imunologia clínica, doenças de pele, doenças infecciosas e parasitárias. Barueri, SP: Manole.

Brunno Câmara Autor

Brunno Câmara - Biomédico, CRBM-GO 5596, habilitado em patologia clínica e hematologia. Docente do Ensino Superior. Especialista em Hematologia e Hemoterapia pelo programa de Residência Multiprofissional do Hospital das Clínicas - UFG (HC-UFG). Mestre em Biologia da Relação Parasito-Hospedeiro (imunologia, parasitologia e microbiologia / experiência com biologia molecular e virologia). Criador e administrador do blog Biomedicina Padrão. Criador e integrante do podcast Biomedcast.
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